Os tratamentos psicanalíticos das psicoses

 

Éric Laurent

 

O título Os tratamentos psicanalíticos das psicoses faz referência ao título que o Dr. Lacan havia escolhido para reescrever o seu seminário sobre as psicoses em 1958. Três anos após o seminário, ele reescreve sob forma de artigo os avanços que fizera e escolhe como título De uma questão preliminar a todo tratamento possível da psicose. Esse texto, que não transcreve a totalidade do seminário e deixa de lado o último trimestre, elucida alguns pontos. Lacan propõe, pela primeira vez, um matema que foi muito utilizado para esclarecer seu ensino, aquele da Metáfora Paterna, e, no entanto, os ensinamentos a ser extraídos desse artigo foram marcados por uma certa ambiguidade. Tomo como signo dessa ambiguidade o embaraço em que se encontraram os alunos de Lacan uma vez publicado o artigo. Cito como testemunho desse embaraço o fato de que, antes da publicação do artigo, os jovens psiquiatras que seguiam o ensino de Lacan, pessoas como Leclaire, Oury ou Perrier tinham, todos eles, publicado artigos sobre o tratamento possível das psicoses. Jean Oury havia publicado um texto sobre a abordagem institucional do tratamento das psicoses. Serge Leclaire escrevera um artigo apoiando-se na distinção dos registros do imaginário e do simbólico no ensino de Lacan. Ele indicava que, na esquizofrenia, era preciso reforçar o imaginário, que era deficitário, e que, na paranoia, era preciso fazer um certo número de operações que viriam a responder ao déficit simbólico. François Perrier enfatizava o manejo da transferência na psicose. Todos esses artigos foram publicados ao mesmo tempo ou ao longo do seminário de Lacan, no ano seguinte. Um pouco mais tarde, depois de 1958 e da publicação de Questão preliminar, houve uma interrupção da publicação de artigos e dos comentários, como se os alunos estivessem incomodados pelos ensinamentos que lhes eram então ministrados e como se as vias de aplicação prática lhes parecessem mais fechadas do que antes. É preciso dizer também que, em 1958, os lacanianos não estavam sozinhos em suas tentativas de tratamento. Portanto, falar de Questão preliminar era fazer ouvir um trovão.

Os anos 1950 são marcados pela multiplicação dos tratamentos psicanalíticos das psicoses. Os kleinianos, desde 1949, trabalham e publicam sobre o tratamento das psicoses, tanto de crianças quanto de adultos.

É a grande época de Bion e Rosenfeld. Por outro lado, há publicações de terapeutas “maternais”, “que maternam”, em torno da Escola Suíça. Ainda me lembro da Sra. Sechehaye, terapeuta muito simpática, recebendo os pacientes em sua casa e lhes explicando, de maneira muito comovente, como realimentar a criança psicótica mal-amada. Havia Bruno Bettelheim, cujos trabalhos eram, na época, menos conhecidos na Europa, mas que começavam a ser conhecidos nos Estados Unidos. Por fim, a Sra. Pankow também publicava numerosos trabalhos. Uma profusão! Lacan intervém dizendo: atenção, questão preliminar! Ele volta, no meio desse desdobramento moderno, às memórias do presidente Schreber e a uma análise renovada da contribuição freudiana. Esse retorno é como uma advertência diante desse desdobramento. É o uso constante, em Lacan, do “retorno a Freud”. Retornar a Freud antes que se desvie demasiadamente dele ao interpretá-lo.

É preciso tomar essa questão preliminar no sentido em que, no artigo de 1953, Função e campo da palavra e da linguagem, Lacan advertia a psicanálise de sua época, aquela dos anos 1950, contra seu enorme sucesso. Sucesso quanto à extensão das indicações, quanto à extensão dos modos de tratamento, quanto à suspensão de todos os interditos colocados por Freud. Em Esboço de psicanálise, o mestre havia tomado um certo número de precauções, ele advertia os psicanalistas contra a extensão das indicações da psicanálise: não se ocupar demais das psicoses e a respeito da psicanálise com crianças ele emitiu, ao mesmo tempo, apreciações positivas e advertências contra o que lhe parecia ser o excesso do kleinismo e de outras orientações. Essas advertências tinham como objeto o excesso ou a grande focalização da interpretação sobre a mãe ou sobre o nascimento, etc. Todas essas indicações foram tranquilamente varridas pelo próprio sucesso da extensão psicanalítica. Os dois maiores campos de sua extensão, as psicoses e o tratamento das crianças, desvelavam os tesouros do imaginário. A tônica da interpretação incidia, sempre mais, sobre o imaginário, o corpo, a unidade imaginária a partir dos sucessos obtidos nas psicoses e no tratamento das crianças. A recomendação da Questão preliminar significava: antes de ir mais longe, à rédea solta, em direção ao que vocês mesmos ignoram, paremos um momento e releiamos a contribuição de Freud com Schreber. Nesse sentido, a reprimenda e o corte de Questão preliminar são coerentes com a orientação lacaniana anunciada desde 1953 em Função e campo da palavra e da linguagem que, ao ser desenvolvido, traz novas perspectivas.

Nesse texto, Lacan faz a análise acurada dos fenômenos de língua do sintoma psicótico, na medida em que ele é exemplar, na medida em que é decomposição espectral do lugar do Outro. Lacan dá, em seguida, uma versão original da possibilidade do tratamento das psicoses. Qual era o consenso na época? Entre os kleinianos, os annafreudianos ou os terapeutas ecléticos, concordava-se quanto ao fato de não haver possibilidade de estabelecer na psicose uma transferência de tipo paterna. Não se podia estabelecer, nesses casos, o mesmo tipo de transferência que na neurose. O que os analistas da época tiravam como consequência disso é que era preciso, então, colocar-se no lugar da mãe [faire la mère], segundo as diferentes versões da mãe. A mãe kleiniana não é a mãe annafreudiana nem aquela de Sechehaye. Ela não é a boa mãe que alimenta; é outra coisa. Outros propunham colocar-se no lugar do irmão [faire le frère], ou seja, fazer uma sociedade sem pai, horizonte da psicoterapia institucional. Em tal sistema de iguais, lida-se, muito mais, com uma espécie de burocracia na qual desapareceu qualquer figura do tipo paterna. Com equilibrações, com tônicas diferentes, havia um certo consenso sobre este ponto: dispensar o pai.

Lacan adverte: por não haver transferência paterna, nem por isso o problema é tomar-se por mães ou irmãos. Trata-se de ver que o que está em questão é a relação do sujeito com a própria língua. A “forclusão do Nome-do-Pai” desnuda a relação com a língua como tal. O horizonte do tratamento possível torna-se, então, o estabelecimento de uma significação nova após a invasão de um gozo inominável, de um mecanismo pulsional que invade o corpo do sujeito psicótico fora do funcionamento das zonas erógenas. A “ausência de interpretação possível em nome do pai” acompanha-se normalmente do desvelamento da maneira segundo a qual a língua do sujeito psicótico é habitada pelo esforço em nomear o gozo inominável. A “língua fundamental”, como se exprime Schreber, desvela um mecanismo comum a toda psicose: o estabelecimento de um uso particular da língua para circunscrever o gozo. Localiza-se aí aquilo que é abordado na clínica freudiana como reconstrução do mundo pelo sujeito psicótico. Essa língua é abordada por Lacan em 1958 a partir de Jakobson, a partir da leitura feita por Jakobson dos trabalhos de Saussure e da relação entre código e mensagem.

Jakobson complexifica o modelo do átomo de significação saussuriano – significante/significado – a partir dos avanços dos anos 1940-1950 sobre as relações código-mensagem. Ele desenvolve, assim, a concepção saussuriana de uma “linguística da fala”. O algoritmo saussuriano significante/significado é um algoritmo que não se presta, em si mesmo, a alojar, a fazer apreender aquilo que garante a unidade do signo. Como se estabiliza essa unidade? Como ela se estabelece? É nesse sentido que a contribuição de Jakobson é crucial. Jakobson é um espírito cuja grandeza deve ser mensurada. Herdeiro da tradição formalista russa, ele recusa um modelo estático da língua, um modelo de produção em que o código produz a mensagem através de regras de criação simples. Jakobson parte do estudo da língua enquanto língua viva transformada, transformável, que inclui fenômenos como a literatura, em outras palavras, os fenômenos de criação, isso que ainda não estava ali, isso que ultrapassa permanentemente toda concepção fixa da língua. Se admitirmos que a mensagem inclui a literatura, a mensagem retorna sobre o código, ela o enriquece e o transforma sem cessar.

O sucesso literário, por excelência, consiste em fazer entrar na língua a palavra que se inventou. Se Victor Hugo é “le plus grand, hélas!”,[1] como dizia Gide, é porque citamos Victor Hugo em francês sem mesmo saber. Ele deu à língua francesa palavras, aspectos, e os inscreveu em nosso patrimônio linguístico. Da mesma forma, se o movimento das Preciosas[2] foi tão importante para a civilização francesa é porque utilizamos um número de metáforas que apareceram inicialmente no círculo das Preciosas e que, em seguida, passaram para a língua. Na literatura contemporânea, Aragon[3] é, sem dúvida, aquele que conseguiu fazer passar a maioria de suas construções para o uso contemporâneo, seja através de seus romances, seja através de seus poemas, isto é, pela musicalização de um certo número deles. Houve contaminação da língua moderna pelas expressões de Aragon. Cereda vem do poema em que aparece o odor do “réséda”, o “mentir verdadeiro” sob a forma do “falar verdadeiro” passou para a língua política, etc. Eis como a mensagem retorna sobre o código e subverte a própria possibilidade do código. Sempre se procurou saber como era feita a literatura e fixar suas regras a fim de reduzi-la a um código entre outros. A redução do conjunto dos tropos ao mais simples era um objetivo dos gramáticos que queriam reduzir as operações retóricas de produção literária. Nunca se conseguiu isso, mas sempre se tenta, desde os gramáticos latinos e gregos. Essa retórica, Jakobson a reduz a duas: em um espírito que não procede da classificação, mas da produção. Produz-se sentido, seja com a metáfora, seja com a metonímia.

Lacan retoma essa invenção e a transforma imediatamente. Ele a aproxima dos termos freudianos deslocamento e condensação. Esse uso ad hoc para a psicanálise confunde a categorização de Jakobson. Para Lacan, o essencial não é reproduzir fielmente as categorias de Jakobson, mas incluir no lugar do Outro, não apenas o reservatório dos significantes, mas a matriz de novas produções. Isso é possível porque a metáfora tem como objeto a substituição de um significante, ao passo que a metonímia é abordada como aquilo que, da pulsão, contamina o significante. Como foi estabelecido por Jacques-Alain Miller, Lacan apreendeu o alcance, para a psicanálise, da operação metáfora/metonímia ao longo de seu seminário sobre as psicoses. Foi naquele momento que ele recebeu a separata de Jakobson sobre esse artigo, o que modificou o curso do seminário. A partir de então, Lacan vê como ele pode estabelecer o matema do lugar do pai enquanto simbólico, a partir da metáfora. Ele precisa, assim, o modo como o Nome-do-Pai vem, de fora do sistema da língua, assegurar os efeitos de sentido, garantir o efeito fálico, estabilizar o sentido sexual marcado pelo pequeno φ do falo. Se o pai deixa de ser o fiador, aquele que garante a estabilização significante/significado, a significação fálica desaparece, e o sujeito é invadido por coisas inomináveis. Ele tem que se haver com um Deus que quer efeminá-lo, ele tem que se haver com fenômenos que o invadem e que não têm nome algum, que vão da excitação maníaca ao estupor, passando por ondas de gozo não localizadas. Eis o que se passa quando o Pai desaparece. O que se passa também é que os códigos e as mensagens se misturam, a língua começa a ser invadida por usos novos com os “códigos de mensagem” e as “mensagens de código”. As vozes anunciam que a palavra Luder, por exemplo, quer dizer alguma coisa cujo sentido se descobre pela experiência de uma alucinação. Schreber recebe, assim, um certo número de informação sobre os usos novos das palavras, das mensagens sobre o código novo. Por outro lado, ele recebe códigos de mensagem, empregos, frases-mensagens que se impõem a ele, que infectam, que parasitam as funções standard da língua. Essas relações código/mensagem introduzem, incessantemente, usos novos. Lacan esclarece essa dupla vertente pela análise acurada das alucinações de Schreber. Isso não havia sido feito por Freud, tampouco pelos psicanalistas que vieram depois dele, exceto um emigrante vienense nos Estados Unidos, William Niederland, que havia iniciado esse estudo sob uma certa ótica. Ele conduzira, de forma isolada, nos Estados Unidos, trabalhos que mostravam o quanto os maus tratamentos do pai de Schreber, os tratamentos “ideais” do educador que o pai de Schreber era, se encontravam no que Schreber nomeava “os milagres”. Ele reduzia as alucinações a uma espécie de epifania, de retorno no real dos loucos métodos educativos de papai, higienista notório. A alucinação é, para ele, uma espécie de síndrome pós-traumática. Mas, fora dessa abordagem parcial, as alucinações de Schreber não tinham sido estudadas como sistema, e Lacan mostra que o aparente caos alucinatório se ordena perfeitamente em torno de uma atividade de nomeação nova graças a esses instrumentos de produção de significação nova, que são as categorias metáfora/metonímia. Nesse momento do tratamento das psicoses, trata-se de dar conta de uma estabilização possível da metáfora delirante sem o recurso ao Nome-do-Pai. Visto que se trata de fenômenos ligados a uma separação código/mensagem, que não há mais garantidor do lado da Metáfora Paterna, é preciso recorrer a uma espécie de neometáfora, de estabilização significante/significado através de uma operação, através de um fenômeno que seja um Nome-do-Pai “não standard”, para retomar a expressão de Jacques-Alain Miller. O Deus de Schreber funciona, em sua relação com ele, como um Outro, sem garantia. É assegurando-se de seu gozo que alguma coisa se estabiliza.

Se me permiti enunciar como título Os tratamentos psicanalíticos das psicoses, é porque, depois da retificação dessa perspectiva por Lacan, seu ensino deslocou a questão. O Nome-do-Pai, que aparecia em toda a sua singularidade freudiana, foi inicialmente pluralizado para, em seguida, se encontrar alojado no conjunto dos nomes da língua que se encarregam da garantia ou da nomeação do gozo. O caminho de Lacan passou do Nome-do-Pai aos Nomes do pai para chegar ao que Jacques-Alain Miller nomeou como “a segunda Metáfora Paterna” em Lacan. O Outro, a língua, encarrega-se da nomeação do gozo em seu conjunto. O Outro é fundamentalmente barrado, fundamentalmente sem garantia. O gozo, sempre em excesso, é um lugar que não tem nome: o significante do que não tem nome se escreve S(Ⱥ).

Essa perspectiva dá acesso a todas as espécies de tratamentos possíveis das perturbações da linguagem. Segundo a concepção que se tem da linguagem, pode-se tratar diferentemente essa perturbação. A perturbação da linguagem abordada por Saussure, modificada por Jakobson, tem como solução a estabilização da metáfora delirante. Trata-se de encontrar ou definir em diferentes abordagens a solução encontrada para a falha da significação fálica, para a não garantia do efeito metafórico falho. Como irá se estabelecer uma prática de pesquisa sobre uma nomeação nova desse objeto que não tem nome?

O conjunto dos departamentos universitários de linguística está atualmente fascinado pelo trabalho de Chomsky, que começou nos anos 1960. Seu grande projeto consistia em descrever a língua não a partir de um sistema de gramática descritivo, estrutural (para cada língua, uma gramática estrutural, que já é um grau de formalização maior que a gramática utilizada pelos literários), mas tomar a linguagem como um universal, e buscar descrever todas as línguas possíveis através dos sistemas de reescritura de regras de alcance universal. Chomsky pensava que a linguagem era um órgão, tendo definição comum somente com a espécie humana. Seu trabalho de definição da língua teve um sucesso poderoso que produziu conexões com as neurociências e com todos os sistemas de tratamento da informação por regra explícita. A evolução do programa de pesquisa deu lugar a muitas concepções diferentes que reivindicam, todas elas, ser dessa orientação. Essa abordagem corresponde à preocupação contemporânea de ter para as línguas sistemas de tradução automática que permitam alimentar os computers de programa, favorecendo o reconhecimento das vozes e a transformação das vozes em sistemas escritos. Trata-se de um esforço impressionante, que tenta reduzir todos os equívocos possíveis nas línguas naturais e obter, por meios distintos daqueles das linguagens oficiais, a mesma redução dos equívocos. Pode-se agora considerar que o programa fracassou. A noção de regra foi a tal ponto repensada por Chomsky que ela se tornou pouco operante. A abordagem “darwiniana” atual de certos linguistas como Stevens Pinker ou Daniel Dennett, à qual faz eco a perspectiva “funcionalista” de linguistas como Fodor, mostra a dificuldade em recompor a atual fragmentação das diferentes orientações de pesquisa.

É o que faz que um linguista como Jean-Claude Milner, por exemplo, possa dizer que considera que o século XX terá visto, ao mesmo tempo, o nascimento e a morte da linguística centrada nas línguas naturais e seus usos. O que aparece aí não tem mais nada a ver com o programa da linguística. A ênfase colocada por Saussure e Jakobson na maneira pela qual a produção dos equívocos perturba, desordena os sistemas de código, é incompatível com esses sistemas de descrição pelas regras. O que se pode chamar de fracasso científico de Chomsky não o impediu de desenvolver teses de política da língua. No intuito de circunscrever a ausência fundamental de garantia do sistema de regras, Chomsky sustentou teses muito radicais sobre a política americana, chegando a desenvolver um extremismo chomskiano particular. Ele é muito sensível à ideia de que, a partir do momento em que falamos, são os poderosos que falam em nós. Como a produção de significação não é estabilizável, o sentido das palavras não se estabelece senão pelo poder. É o poder que fixa as palavras. Ele encontra, assim, aquilo que por muito tempo se chamou o arbitrário do signo. Já que não é na língua que se encontra alojado o fenômeno da garantia, que não há senão as regras que permitem enunciar um certo número de coisas, o sentido não passa de um efeito obtido pelo poder. É o que o leva a uma interpretação muito ampla da primeira emenda, o princípio que garante, na constituição americana, a liberdade da palavra. É o que faz com que se possa sustentar dizeres odiosos, racistas, como se faz permanentemente nas rádios americanas. Corre-se o risco de ser processado, mas evoca-se a primeira emenda e é a Suprema Corte que deverá julgar. Trata-se de um sistema muito complicado, ao qual Chomsky é favorável: deve-se poder tudo dizer, pois é preciso desconfiar se não é o poder que está estabelecendo a significação. Para ele, a estabilização dos componentes significante/significado opera através de um Nome-do-Pai não standard, que é o poder ou a comunidade vigilante dos cidadãos. É nesse sentido que Chomsky chega a uma espécie de pragmatismo paranoide. As condições de enunciação dos enunciados fixam seu sentido em uma conversação geral. Não é possível fixá-lo a partir do exterior com a ajuda do dicionário, em que não se opera senão a salvaguarda aparente do sentido. Não se sabe jamais o que se diz, somente se pode sabê-lo através de uma conversação.

Essa perspectiva pragmática estranha vai ao encontro de outras abordagens filosóficas da linguística, por exemplo, aquela de um autor como W. V. O. Quine, filósofo das ciências que enfatiza o que ele chama de indeterminação da tradução. Esse princípio da indeterminação enuncia que, considerado um fenômeno, haverá sempre várias teorias para descrevê-lo e, portanto, para dizê-lo. Isso vai mais longe do que a oposição feita por Frege entre Sinn e Bedeutung. Frege partia do fato de que “Vênus é a estrela da manhã” e também a estrela da noite. A Bedeutung é a mesma e se pode utilizar Sinne diferentes. Quine generaliza o sistema nas línguas naturais, haverá sempre uma impossibilidade a designar, a reunir de maneira unívoca uma palavra e a coisa. Haverá sempre maneiras distintas de dizer para visar um mesmo ponto. Como concordar quanto ao que significa uma mesma expressão? Isso não pode ser feito senão através de uma pragmática, ponderando a possibilidade de usos distintos e permitindo aí se orientar. Ninguém mais acredita que haja entidades, regras que funcionariam para além das estruturas, fora de seu uso, e que não se deveria, por exemplo, tocar no gênero das palavras, na família tal como ela é. Pode-se fazer usos novos: pode-se dizer “A Sra. Ministra”[4] e não cair duro, fulminado; pode-se ter o PACS,[5] e isso não representar uma perturbação maior no Estado.

Para além do realismo das estruturas, ninguém acredita que seja importante velar sobre a distribuição do sexo na língua ou sobre a distribuição das famílias e dos papéis tais como eles são. Estamos numa época em que se tem o sentimento de poder fazer gambiarras quanto aos usos. Somos levados a considerar que o realismo das estruturas, o fato de haver um real das estruturas, não impede, em caso algum, o estabelecimento de uma conversação, de uma prática com muitos, de uma regulagem sobre o que as coisas querem dizer.

Uma espécie de conversação sobre o gozo é fundamental para definir os tratamentos da psicose. A partir do enigma do gozo, que está sempre em falta ou em excesso no oceano dos nomes próprios, os tratamentos possíveis sempre visaram ajudar o sujeito a nomear essa coisa inominável. Não é ajudá-lo a delirar, é outra coisa. É escolher, no trabalho do delírio, o que conduz, o que vai na direção a uma nomeação possível. Essa nomeação é, ao mesmo tempo, um trabalho de tradução constante daquilo que acontece, daquilo que excede à significação. A psicanálise aplicada à entrevista psicanalítica com o sujeito psicótico é da ordem da tradução constante do que acontece com ele: dos códigos de mensagens e das mensagens de código que o atravessam. O analista está ali para sustentar que é possível desenvolver, acompanhar, manter essa experiência de tradução. É o que Lacan resume em um ponto: trata-se de ajudar o sujeito, com essa nomeação, a “fazer-se um nome”. Pelo trabalho de tradução e nomeação, trata-se de chegar a não ter outro ser senão essa tradução mesma. Fez-se uma primeira leitura um pouco mecânica do “fazer-se um nome”. Esta consistia em acompanhar o esforço do sujeito delirante em direção a uma identidade de gozo, segundo o modelo de Schreber, que quer se fazer “a mulher de Deus”, ou como o Aduaneiro Rousseau,[6] que dizia a Picasso: “Nós somos os dois maiores pintores de nosso tempo; eu, no estilo moderno, e você, no estilo faraônico!” – declaração evidentemente estranha que revelava que o Aduaneiro se considerava “o pintor moderno” de sua época! O uso mecânico desse processo consiste em isolar um uso neológico de um nome que o sujeito se dá e tentar fixá-lo aí como em um significante-mestre. Sabe-se que, na psicose, quanto mais o delírio é sistematizado, mais o sujeito sustenta seu esforço de fala em nome de uma missão, de um ideal. Quanto mais sistematizado, mais sólido é o ideal: tem-se aí “o nome de ideal”. “Eu faço tudo isso porque sou o salvador do planeta, porque sou o Cristo redentor, porque é preciso que eu me renda às evidências, minha missão é essa”. O idealista apaixonado é, assim, uma categoria clínica que pode ser mais ou menos extensa. É preciso acrescentar a essa categoria a fixação do sujeito em “fazer-se um nome” ideal cada vez mais individualizado, adaptado à atualidade, em que o ideal é cada vez menos socializante. Há muitos ideais modestos que são propostos: ser “o melhor vendedor”, por exemplo. Eis um ideal modesto, adaptado. Pode-se identificar a isso, não é o bem universal, é o bem da empresa ou da comunidade na qual se está. Ser o melhor habitante do bairro também. Está mais ligado às pequenas comunidades que formam nosso mundo. Assim, se pode seriar os ideais, que são igualmente identificações ideais possíveis.

Mais fundamentalmente, trata-se de acompanhar o trabalho de nomeação, sabendo que há sempre um princípio de indeterminação da tradução, que é sempre possível encontrar outra maneira de dizer e de prosseguir com uma ou outra maneira de dizer. “Fazer-se um nome” é também dizer que não há outra identificação a não ser o processo de busca do nome que se fixa “um certo tempo”. Quando Lacan diz: “Joyce, o sintoma”, isso é dizer que, como sinthome, Joyce é aquele que consegue identificar-se com seu esforço de produção de uma língua nova, com Finnegans Wake, a operação joyciana sobre a língua é extremamente estranha. Ela não tem mais nada a ver com a verdade do inconsciente. Para ler Finnegans Wake, pouco importa saber qual é a vida de Joyce e quais são as experiências infantis que ele atravessou. Não é a partir daí que se avança. Como observava Jacques-Alain Miller, a sublimação joyciana é inteiramente centrada não sobre a verdade, mas sobre o saber. A única maneira de ler o livro é conhecer todas as referências lidas por Joyce, e se isso dá trabalho aos universitários, é porque eles estão todos fazendo o que gostam: é preciso passar o tempo lendo todos os livros que Joyce leu, e ele leu muito.

Como Joyce se serviu de tudo isso para fabricar sua própria língua a partir do saber? Joyce não é identificável sob a rubrica do “Eu sou aquele que...”. Trata-se muito mais de uma identificação com procedimento joyciano de transformação da língua. Nesse sentido, o tratamento psicanalítico das psicoses consiste em uma conversação com o sujeito, em fazer que ele prossiga em seu trabalho de tradução sempre possível, já que o gozo falta ao oceano dos nomes próprios. É a estrutura lógica fundamental do “ser a mulher que falta a todos os homens” que vemos operar em Schreber. No nosso campo, a partir do momento em que se faz um “todos”, há um objeto que falta, o gozo. A partir do momento em que se traça o círculo que circunscreve o lugar do Outro, aquilo que excede, aquilo que não tem nome no próprio círculo, pode ser anotado S(A): é o significante que está de fora, que falta ao “todos”. É o lugar de um gozo que excede os nomes: “ser a mulher que falta a todos os homens” é ser o nome do gozo que não consegue designar-se por “todos os homens”. É a maneira pela qual Lacan dá um tratamento lógico à missão de Schreber: “tornar-se a mulher de Deus”. “Fazer-se um nome” é alojar-se não apenas sob um nome identificável no registro do ideal, mas, mais profundamente ainda, decidir-se por esse trabalho de tradução da língua. Quando o sujeito pode alcançar isso, encontrar uma certa paz nessa tradução constante, teremos obtido um tratamento psicanalítico possível desse gozo. Entretanto, não se deve ver isso como um conto de fadas: “eles começaram seu trabalho comum de tradução, viveram felizes e tiveram muitas estabilizações delirantes!”

O que é problemático é que um dos modos fundamentais de nomeação é a passagem ao ato. A maneira pela qual o sujeito se situa na fuga do sentido se dá não apenas pela tradução que escapa, ela também, mas também pelo curto-circuito da passagem ao ato. Pode-se fazer um nome pela passagem ao ato: “eu sou aquele que golpeou o Outro”. Foi o que declarou Aimée, o caso da tese de Lacan. A passagem ao ato é sempre possível e está sempre presente. O trabalho de tradução comum deve estar sempre atento ao fato de os curtos-circuitos serem possíveis. O tato consiste, portanto, em permitir que o trabalho prossiga sem muitos curtos-circuitos. Isso depende do caso e das medidas de precaução, de limitação no trabalho, que se desvelam à medida do conhecimento que se tem do sujeito. Apreende-se pouco a pouco que há coisas que são para ele muito difíceis de encontrar, de traduzir, de alojar. Nesse momento, o sujeito vai precisar da ajuda de um tratamento medicamentoso ambulatorial ou de uma internação. Isso faz parte daquilo que está em jogo no trabalho de tradução. Quando há obstáculos que aprendemos a reconhecer como particularmente dolorosos para o sujeito, podemos reconstruir o que é traumático para ele. Quando isso se produz, contribuímos para que o encontro novo se faça em condições tais que o sujeito possa ser não apenas um pouco desabonado de seu inconsciente, mas que ele possa ter se tornado um pouco sensível à grande função dos medicamentos, que são derivados anestésicos. Quando se tem dores muito fortes, tem-se direito à anestesia. Houve, em um certo momento, uma grande recusa à anestesia: “não queremos ser anestesiados, sofrer é o ser do homem! ” A moda passou um pouco, desde os partos até a psicose. Tampouco se deve ceder demasiadamente ao gosto dos tempos, que é a anestesia geral e generalizada! “Não queremos sofrer de jeito nenhum!”. Essa é a versão do hedonismo contemporâneo sob o modo de um: “Queremos ingerir tantos antidepressivos quanto quisermos!”. Não se deve, portanto, ceder ao gosto dos tempos nem ser obcecado por concepções ideais sobre o sofrimento humano. Há aí um registro de desidealização do que está em jogo, a ser seguido pelo terapeuta.

As perspectivas abertas por Lacan em 1958 foram seguidas em seu ensino por desenvolvimentos que permitem repensar o tratamento psicanalítico das psicoses tal como ele é atualmente exercido, efetuado. Convém ressituá-lo nas perspectivas sobre a língua e sobre o lugar do sujeito na língua a partir da pragmática da linguística de nosso tempo. Tomar Joyce como lugar de reflexão cruzada foi para Lacan o momento em que ele desenvolveu e repensou a concepção da literatura precedente da perspectiva de Jakobson. Com Joyce, ele ampliou o campo da sublimação psicanalítica no sentido em que ela pode operar nos tratamentos possíveis das psicoses.

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J.-P. P.: Há uma tensão ou uma equivalência a ser operada entre a posição que coloca o analista em posição de acompanhar o trabalho de tradução e essa outra que dá ao analista o lugar de secretário do alienado?

É. L.: “O secretário do alienado” é uma expressão que tem sua história. Em um artigo publicado em Ornicar? digital, François Sauvagnat lembrava que a expressão havia sido utilizada de maneira negativa por Jean-Pierre Falret, um grande alienista francês cujo ensinamento consistia em não sustentar, com relação aos psicóticos, uma posição passiva. Ele era contra a fascinação de certas escolas pelo “belo delírio” que devia ser anotado rigorosamente. Era preciso ignorar as ideias dos pacientes, o que contava para ele era curá-los, tomar uma posição ativa. Era preciso, antes, dizer-lhes: “tudo isso são bobagens, vamos encontrar para você um centro de acolhimento”, sendo Falret o criador de um certo número de instituições.

A indicação de Lacan consistia no uso irônico dessa expressão, que atravessa a psiquiatria francesa e que ele transforma ao longo de suas leituras hegelianas. Hegel disse: “O filósofo é o secretário da história”. Ele não é o secretário dos príncipes, dos grandes desse mundo, ele é o secretário da história. Ele recusava a grande colusão de sempre entre o príncipe e o filósofo. Hegel, universitário, fala para a história. Ele zombava do rei, embora fosse o grande teórico da monarquia constitucional. Ele é o secretário da história, pois detém o seu conceito. Ele acrescenta aí o seu conceito. Quando Lacan, na Proposição de 1967, diz que o psicanalista “acrescenta sua lógica à interpretação do inconsciente”, ele dá continuidade a essa ideia. É o inconsciente que interpreta, mas o psicanalista acrescenta aí a sua lógica. O secretário não se recolhe a uma posição passiva. Ele extrai daí o conceito. É isso que lhe permite, em seguida, ter uma ideia da situação do objeto a? Onde está o gozo em jogo? Qual é a coisa inominável para o sujeito? É isso que permite, em seguida, guiá-lo. Por exemplo, às vezes é preciso fazer de modo que o sujeito pense em outra coisa. Não se deve acreditar em Papai Noel. Algumas vezes, não se pode contar com o apoio do trabalho de tradução. É preciso conduzir as coisas de outro modo. Às vezes, é preciso fazer isso com muita energia, paciência e cuidado. Aí se ‘se faz o secretário’ em outro sentido do termo. Por um lado, toma-se nota das produções do inconsciente, mas isso não implica não ter uma posição extremamente ativa na interpretação. O trabalho de tradução comum implica uma atividade bastante intensa por parte daquele que ocupa o lugar do garantidor da tradução possível.

A ideia do “secretário do alienado” combina muito bem com a ampliação pragmática da perspectiva, o que corresponde com a prática contemporânea do tratamento das psicoses. Não se está mais nas oposições mecânicas dos anos 1950, que consistiam em reforçar o déficit imaginário, reforçar o déficit simbólico, substituir a lei pela regulação. Essas oposições tinham sua pertinência e podemos usá-las. As indicações de S. Leclaire ainda são úteis. Quando se tenta, por vias imaginárias, ‘fazer um corpo’ para aquele que não o tem, através da modelagem, das práticas do tipo arteterapia, desenhos, etc., isso é muito bom, mas não é tudo. Não é o alfa e o ômega do negócio, mas faz parte dele. Tem-se, aliás, acrescentado à parafernália dos dispositivos de conversação, por exemplo, a oficina de cartas. Promovem-se a escrita de cartas, pois se acredita que, na psicose, isso é algo muito interessante. Tudo isso faz parte do vasto trabalho de conversação com o sujeito psicótico. Traduzir e estabilizar corpos, formas de corpos, participar do trabalho de estabilização das formas de escrita no sujeito psicótico são obras necessárias. Tudo isso faz parte da boa definição do secretário inventivo do alienado.

B.L.: Eu gostaria de lhe pedir para desvincular esse trabalho de tradução do reproche: “Você faz seus pacientes delirarem”. A tradução é uma tradução orientada a partir do que é o inominável gozo, e isso não tem nada a ver com a vontade de fazer “girar” o delírio, fazendo-o amplificar-se. Convém precisar que essa nomeação não é o delírio em todas as direções.

É.L.: Estou totalmente de acordo. Compartilho da sua preocupação. Mais os delírios são sistematizados, mais é preciso prestar atenção, pois a pressão quanto a “fazer-se reconhecer” é grande. É preciso, aliás, distinguir o delírio e o seu azimute, a sua direção. Quanto mais paranoico for o sujeito, mais interesse se tem em que haja uma pluralização do endereçamento e da transferência. Recentemente, durante uma apresentação, encontrei um sujeito paranoico que queria que se reconhecesse a legitimidade de um acidente de trabalho bizarro que havia lhe causado sofrimentos desconhecidos e preocupado muito a medicina, a ponto de se supor uma origem genética desconhecida. Esse sujeito tinha obtido o reconhecimento de uma invalidez, mas ele queria um outro reconhecimento. Ele queria participar das paraolimpíadas. A partir do momento em que se tornou deficiente, ele quis participar desses jogos, mas com um toque de grandeza. Sobretudo, ele criava empresas, seu pai havia criado empresas. Esse sujeito já tinha dado início a um processo contra a organização das paraolimpíadas porque ele não estava na categoria que deseja. Ele considerava que um complô estava sendo organizado contra ele. Além do mais, em sua vida de ciumento patológico, ele se encontrava diante daquele que ele acreditava ser o amante de sua mãe, cercado de coisas suspeitas, de mensagens que havia interpretado. Ele, então, agrediu esse homem, que ficou hospitalizado durante três meses; ele o agrediu com uma violência decidida na passagem ao ato, de dimensão psicopática. Esse sujeito tem agora dores tais que ele quer sempre mais derivados de morfina; o médico tenta contê-lo e tem medo da situação. Nesse contexto, convém pluralizar o endereçamento. É melhor que ele tenha a maior quantidade possível de processos no conjunto de suas relações. Isso o manterá ocupado através da organização de sua queixa. Ele poderá se queixar ao Um daquilo que o Outro não fez, o que permite evitar a focalização sobre o Um, que é pior. Não se trata, neste caso, de traduzir no sentido linguístico, mas de fazer operar uma espécie de tradução paralela, graças ao Direito, segundo as linhas de força que a contingência do caso permite. Sempre que lhe é dado um signo de reconhecimento, ele quer outro mais. Não há, propriamente falando, tratamento simbólico que o seja de fato. Em vez disso, há todo um sistema que pode se encarregar da questão. Ao contrário, quando se tem um sujeito esquizofrênico disperso, tenta-se cristalizá-lo: tenta-se unificá-lo, com oficinas, com práticas que colocam em jogo o imaginário. Conforme a idade, o que é possível vai da escultura, passando pelo desenho, à música, às práticas de grupo, à pega sobre o corpo do outro. Existem diversas práticas, façam o que puderem, mas ativamente e dentro do que a estrutura permite. Isso não tem nada a ver com deixar o sujeito delirar e esperar tranquilamente que a coisa passe. Isso seria acreditar que a natureza é boa, como na medicina hipocrática, no mau sentido do termo. É a má concepção do delírio como tentativa de cura. Não é o que Freud queria dizer ao isolar a importância do delírio. É muito importante mostrar que a conversação pragmática sobre a significação que se estabelece não nos faz esquecer o realismo da estrutura: clinicamente, há paranoia e esquizofrenia. Há também todos aqueles casos que não fazem parte desse recorte. É o realismo da estrutura que deve fazer do analista o secretário, atento ao caso, nominalista, bem centrado sobre o que se diz, que não deixa escapar um encadeamento, que vela sobre o realismo das estruturas e intervém levando em conta esses entrelaçamentos e esses nós.

 

Tradução: Yolanda Vilela

 

Éric Laurent é psicanalista em Paris. É AME das seguintes escolas da AMP: EBP, ECF, EOL, NEL, ELP, NLS. É ex-presidente da Associação Mundial de Psicanálise. Entre suas publicações destacamos: O avesso da biopolítica. Contra Capa, 2016; A batalha do autismo. Zahar, 2014. A sociedade do sintoma. Contra Capa, 2007.

Este texto foi publicado originalmente na revista Les feuillets du Courtil, n. 21. Bélgica: Les feuillets du Courtil, 2003. Foi traduzido em 2003, com a amável autorização do autor, para a revista Papéis de psicanálise: as pequenas invenções psicóticas. Belo Horizonte: IPSMMG, ano 2, maio 2006. Derivas analíticas agradece a Márcia Rosa, editora de Papéis, pela autorização da republicação do artigo, que, nesta versão, encontra-se revisado e ligeiramente modificado.

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 Notas: 

[1] Tal apreciação de André Gide sobre Victor Hugo pode ser entendida como: “Victor Hugo é o maior de todos os poetas, infelizmente!”. Para Gide, apesar de seus excessos, de seu estilo efusivo, Hugo é o maior poeta da língua francesa. As criações poéticas de Hugo são verdadeiras pérolas encontradas em meio a uma profusão de palavras e formulações. (N.T.).

[2] Movimento das Preciosas ou Preciosidade: fenômeno ao mesmo tempo social, moral e literário que se manifestou na primeira metade do século XVII. No sentido estrito, a preciosidade foi um movimento essencialmente francês que se desenvolveu em dois lugares privilegiados de Paris: a “Chambre bleue” do hotel de Rambouillet, onde, de 1620 a 1648, a Marquesa de Rambouillet reunia a melhor sociedade de sua época; depois, de 1653 a 1661, o salão da Srta. De Scudéry (Cf. Le Petit Robert des Noms Propres. Paris: Dictionnaires Le Robert, 1994.) (N.T).

[3] Aragon (Louis): escritor e poeta francês (1897-1982). Aragon foi um dos fundadores do movimento surrealista. Em 1927 aderiu ao partido comunista e o encontro com Elsa Triolet, cunhada de Maiakovski, o levou a se colocar a serviço da Revolução e a romper com o surrealismo. Os romances de Aragon, principalmente Aurélien, mantêm relações complexas e profundas com sua biografia. Complexas, pois a arte do romance é o que ele chama um “mentir verdadeiro”, e o romancista, contrariamente ao poeta lírico cuja sinceridade se pretende visível, avança mascarado por detrás das personagens. Profundas, pois Aragon precisa dessa máscara para dizer o que ele não diz em outro lugar sobre a sua própria vida. Principais obras: Les Beaux Quartiers (1936 - Prix Renaudot); Aurélien (1942); La mise à mort (1965); Blanche l’oubli (1967). (N.T).

[4] Em 1998, o então primeiro-ministro francês, Lionel Jospin, lançou uma circular preconizando a feminização dos nomes de profissões no Estado francês; até essa data, prevalecia o emprego da forma masculina. O que antes dessa data era designado pelo masculino, Madame “le Ministre”, passou a admitir o emprego do feminino, ou seja, Madame, “la Ministre”. Hoje as duas formas são consideradas corretas. (N.T.).

[5] PACS: O Pacto Civil de Solidariedade é uma das formas de união civil do Direito francês. Trata-se de um contrato concluído entre duas pessoas maiores de idade, de sexo diferente ou do mesmo sexo, para organizar a vida em comum. O PACS cria direitos e obrigações para os parceiros, notadamente uma ajuda mútua e material. (N.T.).

[6] Pintor francês (Laval, 1844 - Paris, 1910). Alguns traços de sua biografia revelam uma certa malícia e uma tendência à mitomania. Se seu traçado é considerado frequentemente “duro” e seu desenho “desajeitado”, Rousseau possuía um sentido agudo da composição e raro dom de colorista. Se ele foi, por um lado, o precursor de uma categoria de pintura dita naïve, por outro, ele contribuiu sobretudo com a abertura de novas perspectivas plásticas e expressivas que influenciaram Picasso e Léger. (N.T.).

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