Maria Elisa Pereira de Almeida[1]

 

 

Introdução – O Grupo Miguilim de Cordisburgo

No centro de Minas Gerais, a pequena cidade de Cordisburgo abriga um museu, outrora casa onde nasceu o escritor João Guimarães Rosa (1908-1967). Hoje, é o Museu Casa Guimarães Rosa (desde 1974), que reúne bom acervo de fotos, aproximadamente 700 documentos textuais, toda a obra literária, originais manuscritos ou datilografados, a exemplo de Tutaméia (última obra publicada), matrizes de xilogravuras usadas em volumes como Corpo de baile (1956), máquina de escrever, rascunhos de trabalhos, coleção com as gravatas-borboleta do escritor e outros objetos pessoais.

Desde 1996, os turistas visitantes que acorrem a esse Museu são recebidos por um dos jovens da cidade que atua aí como cicerone. Integrantes do Grupo Miguilim, esses jovens recebem formação especializada para brindar o visitante com um trecho vivo da obra do escritor conterrâneo, narrado em voz alta, de cor. Inúmeros são os depoimentos de espectadores ouvintes que se encantam ouvindo Rosa nas vozes dos jovens “miguilins” e dizem-se motivados a iniciar ou se aprofundar na leitura do escritor.

O exercício de quase três décadas como narradora oral de texto poético e o trabalho com a formação de jovens narradores, no mesmo ofício, inspiram a minha pesquisa sobre o acontecimento da narração oral do texto poético (ou da literatura). Apresento, a seguir, alguns pontos dessa pesquisa teórica, ainda em andamento.

O ressoo da voz poética medieval

Ao debruçar-se sobre a cultura e, mais detidamente, sobre a poesia oral da Idade Média, Zumthor (1987/1993, p.63) destaca que, os séculos X, XI e XII representaram um período brilhante e de grande prestígio para o recitador, o contador, o ator ou o leitor público, o jogral ou o cantor ambulante, também conhecido, um pouco mais tarde, como menestrel. Sempre em conexão íntima com a sua própria experiência, com a de seus contemporâneos e, sem dúvida, também, com as vivências de seus antepassados, esses intérpretes orais narravam contos maravilhosos e fábulas, declamavam poemas, cantavam canções de gesta, às vezes, também bailavam, tocavam a cítara ou a pequena lira e realizavam leituras públicas. Nômades ou não, o traço comum entre todos eles, por mais heterogêneo que o grupo possa ter sido, era o fato de serem os detentores da palavra pública e os portadores da voz poética (ZUMTHOR, 1987/1993, p.57).

Existia, também aí, mas nem por isso sem a sua importância, uma parcela ínfima de letrados que lidava com a poesia em sua forma escrita, constituída pelos clérigos, escritores e aqueles que podiam exercer a função da escritura (ZUMTHOR, 1987/1993, p. 283).

Até meados do século XII, a grande maioria dos que lidavam com a “coisa poética” no Ocidente, o fazia por meio de suas vozes: eram os intérpretes orais. Andando por muitos caminhos da Idade Média, foram eles os responsáveis pela circulação de um imenso patrimônio. Como escreve Zumthor (1987/1993, p. 71):

A palavra poética vocalmente transmitida dessa forma, reatualizada, reescutada, mais e melhor do que teria podido a escrita, favorece a migração de mitos, de temas narrativos, de formas de linguagem, de estilos, de modas, sobre áreas às vezes imensas, afetando profundamente a sensibilidade e as capacidades inventivas de populações que, de outro modo, nada teria aproximado. Sabe-se quantos contos circularam assim de um extremo a outro da Eurásia.

Em seu ensaio “O narrador”, Benjamin (1936/1985) dá atenção especial à narrativa medieval, considerando-a uma forma artesanal de comunicação que floresceu não só entre os nômades narradores anônimos e aprendizes ambulantes, mas, também, no ambiente tão propício das corporações de artífices, em torno das mais antigas formas de trabalho manual. Nesse sentido, o sistema corporativo medieval muito pôde contribuir para o encontro do mestre que detinha o saber do passado, recolhido no curso de seu trabalho sedentário, com o aprendiz migrante, que trazia os saberes das terras distantes. Sabe-se que cada mestre, outrora, fora também um aprendiz ambulante que, ao se fixar numa corporação de artífice, em sua própria pátria ou fora dela, sempre tinha a oportunidade de trabalhar numa mesma oficina com novos aprendizes (BENJAMIN, 1936/1985, p.199).

A figura do narrador tradicional da Idade Média, em Benjamin, traz à tona a outra face do narrar: a ação do escutar. Para o autor, a escuta pôde encontrar lugar bastante apropriado nas corporações de oficio, por exemplo, ao lado da ação de fiar ou tecer, justamente por essas últimas favorecerem um estado de “distensão psíquica”, na comunidade dos ouvintes, distensão diretamente ligada à memória. O conteúdo ouvido era naturalmente gravado, tornando-se logo disponível para ser narrado e re-narrado. Conforme Benjamin (1936/1985, p. 205):

Contar histórias sempre foi a arte de contá-las de novo (...). Quanto mais o ouvinte se esquece de si mesmo, mais profundamente se grava nele o que é ouvido. Quando o ritmo do trabalho se apodera dele, ele escuta as histórias de tal maneira que adquire espontaneamente o dom de narrá-las. Assim se teceu a rede onde está guardado o dom narrativo.

No contexto das transmissões orais medievais, tendo a voz como canal primeiro de expressão, o papel dos intérpretes orais ligava-se diretamente ao entretenimento. Nesse sentido, o que definiria esse grupo, mesmo que heterogêneo, dos detentores da palavra pública seria “sobretudo, a natureza do prazer que eles têm a vocação de proporcionar: o prazer do ouvido; pelo menos, de que o ouvido é órgão” (ZUMTHOR,1987/1993, p.56-57). Trata-se, aqui, do conteúdo poético que era concebido e transmitido oralmente.

Em seu livro, Oralidade e escritura, Walter Ong apresenta resultados de uma importante investigação, realizada por cerca de vinte anos, no campo da chamada “descoberta moderna da oralidade”. Ele busca definir tipos diferentes de oralidade a partir da presença mais ou menos potente da escrita e de outros meios tecnológicos (ONG, 1988/1998, p.19). Tal dicotomia – oralidade/escrita – posta dessa maneira foi questionada por estudiosos da área, já que poderia facilmente levar ao erro de reduzir o entendimento da primeira à ausência da segunda. Podemos acompanhar parte desse debate, na pesquisa desenvolvida por Nogueira (2014, p.22) dentro do tema. O autor argumenta que, de fato, constitui ameaça constante aos estudiosos da área apresentar o conceito de oralidade de modo negativo, realçando-lhe os traços que contrastam com a escritura e, por isso mesmo, muitas vezes, deixando de chamar a atenção para os traços positivos presentes, em uma cultura oral. A estudiosa Dupont (1991, p. 12), para quem a “modernidade nos priva da metade de nossa herança, fazendo da oralidade uma simples ausência da escrita”[2], mostra-se atenta a essa questão. Em seu livro, a autora busca devolver à cultura oral a sua própria autonomia.

No confronto dessa mesma questão, Zumthor traz à baila o conceito de vocalidade, para o qual mostra sua preferência em relação ao conceito de oralidade. Mesmo considerando a linguagem como sua manifestação central e, num certo sentido, até independente dela, a vocalidade incluiria funções e valores que são próprios à voz: “o exercício da sua força fisiológica, sua faculdade de produzir a fonia, a ação de organizar essa substância” (ZUMTHOR, 1983/ 2010, p. 25). De posse do conceito de vocalidade, entramos no âmbito da voz enquanto tal, na sua própria materialidade, naquilo que ela tem de si que, inclusive, excede a palavra. Aproximamo-nos da voz particular, da voz individual.

Cada ser humano é um e pode manifestar isso por meio da sua voz, que traz um timbre único e que vem de uma garganta, de um corpo, emitida por alguém, portanto. Em seus estudos, Cavarero (2003/2011, p.22) destaca que, “[...] no registro da voz, ecoa a condição humana de unicidade”, ou seja, a singularidade própria de cada um, que não pode ser imitada. Para a autora, entretanto, a tradição da filosofia ocidental – de Platão a Derrida –, marcadamente logocêntrica, pautou-se, na maioria das vezes, por uma metafísica baseada em abstrações generalizadoras como Homem, Ser, etc., relegando para segundo plano as existências que, assim como a voz, são únicas e singulares. A tematização da voz era, assim, comumente feita considerando-se a voz como voz em geral, como se a emissão sonora não dependesse de alguém para acontecer.

Retornemos o nosso olhar para a Idade Média. Nas performances[3] orais que aí tiveram lugar, no centro da cena, em conexão sensorial íntima com a comunidade de ouvintes, ressoa uma voz, uma voz plena de vocalidade, uma voz extravasante, ouvida para além das palavras para as quais dá corpo. Palavras, por sua vez, sem amarras, palavras aladas, como nos diria Borges, que circulam livremente num ambiente mormente “analfabeto”, anterior a uma certa submissão, que a linguagem passará a ter com a disseminação da escrita, às regras rígidas que lhe serão impostas, em um novo contexto. Palavras entregues à musicalidade do vocálico[4].

A transição – o estímulo tátil da voz

A partir do século XII, principalmente com o advento da escrita e com a mecanização das forças produtivas, pouco a pouco, os narradores e poetas orais foram perdendo seu espaço e caindo em descrédito. Em suas pesquisas, Zumthor (1987/1993, p. 96-117) descreve o lento processo ligado à aquisição das operações da escrita e da leitura, o que representou mudanças profundas na esfera social e individual. Primeiro, surge o escrevedor ou copista, que realizou intenso trabalho na confecção dos primeiros registros escritos: os manuscritos. Sabe-se que o processo da escritura dos manuscritos foi, nesse começo, estreitamente vinculado e dependente da voz, do estímulo quase “tátil” de cada palavra dita em voz alta. As grafias desse período sugerem que, para o copista, as imagens das palavras que precisavam ser interiorizadas, muito mais do que visuais, eram sonoras (ZUMTHOR, 1987/1993, p.102).

Ao lado da operação da escritura, desenvolveu-se a da leitura, porém em ritmo mais lento ainda, já que era tida como operação de maior complexidade. Também, o processo de aquisição da leitura esteve fortemente dependente dos estímulos sonoros da voz, para dar os seus primeiros passos. Para enfrentar os constantes problemas que se apresentavam ao leitor na “decifração” das diferentes grafias, a articulação vocal era o melhor caminho. O aumento crescente dos escritos em circulação, aos poucos, proporcionou mais oportunidade para um número cada vez maior de novos leitores, o que acabou por levar ao desenvolvimento da leitura silenciosa “ocular” (ZUMTHOR, 1987/1993, p.105).

A invenção da imprensa, no século XVI, trouxe consigo a democratização do acesso aos registros escritos, o que pôde acelerar, mais ainda, a conquista da chamada leitura silenciosa “ocular”. É importante constatar, como reflete Zumthor (1987/1993, p.98), que, paralelamente a todo esse processo de disseminação da escritura e da leitura, aconteceram várias mudanças de forma bastante lenta, que caminharam na direção da “dissociação entre um código oral e o código escrito; distinção, entre a langue e a parole”.

Entendemos que o período brevemente descrito acima significou uma grande e paulatina transição entre uma cultura centrada e dependente da voz para outra cultura: a da letra, do registro escrito e do livro. Conforme descreve Zumthor, durante um bom espaço de tempo, mais de quatro séculos, mesmo com a expansão da prática da escritura, a voz insistia, ainda, em se impor a todo preço e imprimir nos manuscritos o seu selo “sonoro”. A leitura, por sua vez, operação mais difícil, nesse começo, precisava evocar o som de cada palavra e ser dita em voz alta, para ser entendida. O homem em transição levou algum tempo de exercício até que aprendesse, aos poucos, a dissociar os dois códigos – o oral e o escrito –, até que amadurecesse internamente o novo modelo linguístico, para tornar-se capaz de utilizá-lo. É interessante notar que, somente com o estabelecimento da leitura silenciosa. chamada também “ocular”, é que

[...] uma esfera de intimidade [grifo nosso] se cria entre o leitor e o texto na qual o intercâmbio se intensifica, enquanto o contexto exterior se distancia e se apaga. Não é mesmo por acaso que, no meio letrado, o termo escrever comece a ter sentido de ‘compor (uma obra, um texto)’. [grifo do autor] (ZUMTHOR, 1987/1993, p.106).

A conquista da leitura silenciosa e da “esfera de intimidade”, que de certa maneira a propiciou, é, em escala ampla, mais ou menos contemporânea do nascimento do escritor, aquele que comporá a literatura.

O termo geral literatura abarca duas qualidades de textos escritos. A primeira seria aquela que abrange os textos que, conforme Dupont (1991, p.13), desde sua origem são escritos em que “[...] a poética explora legitimamente a escritura”[5], dos quais podemos dizer, também, que pertenceriam ao âmbito do que é denominado, por alguns, literatura autoral. A outra qualidade de textos é a daqueles que foram concebidos na oralidade, porém, posteriormente, foram transcritos, transpostos para o universo da escrita. Para Dupont (1991, p. 14), esses últimos seriam uma espécie de “pretensos textos” uma vez que, num determinado momento, ainda que tenham se tornado textos escritos, nem por isso passaram a ser “legíveis”. Isso porque “[...] a língua escrita não reconhece nenhuma pertinência a isso que ela não transcreve: a entonação, a gestualidade, a personalidade do locutor, todo o contexto enunciativo, o sol, a paisagem, a qualidade do ar e os acontecimentos do dia”[6]. (DUPONT, 1991, p. 13). Tais textos, justamente por isso, se incluiriam na controvertida categoria de “literatura oral”.

A voz no texto literário

Interessa-nos agora, por fim, focalizar a literatura pertencente ao primeiro grupo, acima mencionado, aquela que tem seu berço no mundo da escrita. Aquela literatura que é fruto de uma realidade que, mesmo sem ter erradicado completamente o analfabetismo, encontra-se permeada, até o âmago de suas instituições, pela escrita e pela cultura letrada.

Em seu prefácio intitulado “Variações sobre as Bucólicas”, Valéry (1944/1999, p.18) nos fala da poesia como “uma arte de obrigar continuamente a linguagem a interessar imediatamente ao ouvido (e, através deste, tudo o que os sons podem excitar por si mesmos) ao menos quanto interessa à mente” (grifo do autor). Ao se referir ao verso (e, aqui, acreditamos ser legítimo estender o entendimento do autor ao gênero poético criado em prosa), o autor nos diz que, ao mesmo tempo em que as sequências de sílabas e as combinações das palavras deveriam compor-se em um “sentido provável”, as mesmas sequências devem compor-se, também, em uma espécie de “figura para o ouvido” (VALÉRY, 1944/1999, p.18).

Vemos que, aqui, mesmo tratando-se do texto poético composto por escrito, a partir do entendimento de Valéry, com a ideia da linguagem que atende a uma “figura para o ouvido”, somos novamente remetidos à questão da vocalidade, conforme coloca Zumthor, ou mesmo da própria oralidade.

O Léxico do drama moderno e contemporâneo, organizado por Sarrazac, apresenta pequenos debates, confrontos de ideias de autores diversos sobre temas/verbetes variados, dentro do campo do drama. Acompanhando a noção de oralidade, vemos que ela nem sempre foi uniforme. Meschonnic (SARRAZAC, 2005/2012, p.130) explora, no conceito, um lado não usual, diverso do que vigora comumente. Para ele, a oralidade (diferentemente das noções do falado e da oralização) refere-se a um modo de significar específico, “caracterizado por um primado do ritmo e da prosódia no movimento do sentido”, um modo no qual, a instância da escrita “subjetiva ao máximo sua fala”. É justamente no texto literário que tal oralidade realizar-se-ia plenamente.

Na investigação que desenvolveu sobre o tema da voz, Cavarero (2011, p. 25) reconhece que nem mesmo os chamados “estudos modernos sobre a oralidade” puderam dar lugar ao tema da voz, enquanto unicidade, que se liga diretamente à individualidade. Entretanto, a autora destaca que esses mesmos estudos tiveram um grande mérito, evidenciaram a presença de um campo da palavra, no qual a soberania da linguagem se rende à soberania da voz: trata-se do âmbito da poesia.

Conforme vimos, a voz dos intérpretes medievais ressoou levando a poesia oral a longas distâncias, na Eurásia. Ao declínio e desprestígio dessa voz do poeta oral, sucedeu-se a conquista paulatina e mais generalizada da escrita e da leitura que, por sua vez, significaram, a médio prazo, a possibilidade da dissociação entre a linguagem e a fala. A aquisição mais definitiva da leitura silenciosa “ocular” consolidou o estabelecimento do espaço da subjetividade (ZUMTHOR, 1987/1993). Nasce o autor, ou, como nas palavras de Meschonnic (2007/2009, p.99) legitima-se o que ele denomina “sujeito do poema”, “subjetivação máxima de um sistema de discurso.”

Dentro das perspectivas desses últimos autores citados – Valéry, Meschonnic e Cavarero –, que não iremos aprofundar nesse momento, cada um, a sua maneira, sobrevém a presença de uma substância sonora, no texto poético concebido na escritura.

Ora, essa substância sonora do texto poético, que Valéry nomeia como espécie de figura para o ouvido, está acessível para a recepção do leitor. Mas o ator/narrador oral de literatura, nos dias de hoje, abre um “novo” canal de expressão/recepção da literatura: é o acontecimento artístico da narração oral de cor do texto poético que volta a privilegiar o prazer proporcionado pelo ouvido. O acontecimento da narração oral reconduz, para o centro da cena, aquilo de que o ouvido é órgão. Mas, o que é ouvido, num momento imediatamente anterior, que corresponde ao que é falado e que é o objeto da narração, não é mais a literatura oral, concebida num universo próprio, conforme o foi, na Idade Média. Não pode sê-lo mais, ainda que, em alguma medida, no contexto do mundo letrado, busque sobreviver, hoje, por exemplo, com os griôs africanos e os repentistas do nordeste brasileiro. O objeto do acontecimento da narração oral – que corresponde ao que é narrado/ouvido e aqui investigado por nós – é a literatura que nasce na escrita. Uma vez que essa literatura foi concebida, também, como “uma figura para o ouvido”, o ato de dizê-la em voz alta potencializa aquilo que já se encontra lá. Por tratar-se de uma narração memorizada, de cor, seguindo as palavras escritas, num ambiente mais intimista, propicia uma proximidade sensorial maior com o seu ouvinte, espectador. E isso nos levaria a outras questões que não trataremos, neste artigo.

Ao narrar de cor o texto poético, o narrador oral empresta seu corpo, sua garganta, sua voz, seu timbre, “atualizando” a oralidade presente no texto literário. A voz de um narrador oral trazida para a cena convoca outra voz: a do sujeito do poema, com o ritmo e a prosódia impressos no texto, produtores de sentido e de beleza.

 


 

Notas

[1] Doutoranda vinculada ao PPG-Artes/EBA-UFMG. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

[2] la modernité nous prive de la moitié de notre héritage, en faisant de l’oralité une simple absence d’écriture. (Todas as traduções da língua francesa foram feitas pela autora deste artigo.)

[3] Utilizamos a palavra performance tomando o termo na sua acepção anglo-saxônica, assim como o faz ZUMTHOR (2010, p. 31): “ação complexa pela qual uma mensagem poética é simultaneamente, aqui e agora, transmitida e percebida”.

[4] Empregamos a palavra vocálico, aqui, não no sentido de estar relacionada às vogais, mas referindo-se às esferas da voz, do canto e da linguagem (conforme Cavarero, 2003/2011).

[5] la poétique explore légitimement l’écriture.

[6] la langue écrite ne reconnaît pas: l’intonation, la gestualité, la personnalité du locuteur, tout le context énonciatif, le soleil, le paysage, la qualité de l’air et les événements du jour.


Referências

BENJAMIN, W. (1936) O narrador. Considerações sobre a obra de Nicolai Leskov. In: BENJAMIN, W. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre a literatura e história da cultura: obras escolhidas. Trad. Sérgio Paulo Rouanet. 8ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1985, p. 197-221.

CAVARERO, Adriana. (2003) Vozes plurais: filosofia da expressão vocal. Trad. Flavio Terrigno Barbeitas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011.

DUPONT, Florence. (2001) Homère et Dallas. Paris, Hachette, 2001.

MESCHONNIC, Henri. "La ponctuation, graphie du temps et de la voix". Revue La Licorne , 52, 2014 (ÉPUISÉ). Disponível em: http://licorne.edel.univ-poitiers.fr/document5856.php (Acesso em: 11/out/2018).

MESCHONNIC, Henri. (2007) Ética y política del traducir. Trad. Hugo Savino. Buenos Aires: Leviatán, 2009.

NOGUEIRA, Erich Soares. Vocalidade em Guimarães Rosa. 2014. 208 f. Tese de (Doutorado em Teoria e História Literária). Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, 2014.

ONG, Walter. (1988) Oralidade e cultura escrita: a tecnologização da palavra. Trad. Enid Abreu Dobránszky. Campinas, SP:Papirus, 1998.

SARRAZAC, Jean- Pierre (Org.). Léxico do drama moderno e contemporâneo. Trad. André Telles. São Paulo: Cosac Naify, 2012.

VALÉRY, Paul. (1944) Variações sobre as Bucólicas. Trad. Raimundo Nonato Barbosa de Carvalho. Suplemento Literário. Belo Horizonte: Secretaria de Estado da Cultura, 1999.

ZUMTHOR, Paul.(1987) A letra e a voz: a “literatura” medieval. Trad. Amálio Pinheiro e Jerusa Pires Ferreira. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.

ZUMTHOR, Paul. (1983) Introdução à Poesia Oral. Trad. Jerusa Pires Ferreira, Maria

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